O Julgamento das Nossas Obras

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Texto Bíblico: 1 Coríntios 4.1-5

1 Assim, pois, importa que os homens nos considerem como ministros de Cristo e despenseiros dos mistérios de Deus.
2 Ora, além disso, o que se requer dos despenseiros é que cada um deles seja encontrado fiel.
3 Todavia, a mim mui pouco se me dá de ser julgado por vós ou por tribunal humano; nem eu tampouco julgo a mim mesmo.
4 Porque de nada me argui a consciência; contudo, nem por isso me dou por justificado, pois quem me julga é o Senhor.
5 Portanto, nada julgueis antes do tempo, até que venha o Senhor, o qual não somente trará à plena luz as coisas ocultas das trevas, mas também manifestará os desígnios dos corações; e, então, cada um receberá o seu louvor da parte de Deus.

INTRODUÇÃO

Em 1921, David e Svea Flood[1] com o filho de 2 anos e o casal Joel e Bertha Erickson, partiram da Suécia em direção ao interior da África, para o Congo, atual Zaire. Foram como missionários, pregar o Evangelho a tribos africanas ainda não alcançadas.

Não sendo bem recebidos em nenhuma das aldeias, tiveram que montar um acampamento nas proximidades de uma delas, tendo de conviver com os nativos hostis. Apenas um garoto podia visita-los para lhes vender galinhas e ovos. Esse garoto se converteu.

Svea engravidou de uma menina e, devido à malária não puderam viajar, tiveram que fazer o parto na montanha em sua cabana de barro. 17 dias depois do nascimento de Aina, Svea Flood morreu.

Desesperado, com ira e o coração amargurado, David enterrou a sua esposa de 27 anos. Deixou Aina com o outro casal de missionários e voltou para a Suécia com o seu filho mais velho. David não queria mais saber do Evangelho. Para ele aquela missão foi um trágico desperdício.

Aina ficou órfã novamente porque os seus pais adotivos morreram envenenados. Outro casal a adotou e foram embora para os EUA, onde ela cresceu. Somente após 45 anos Aina conseguiu ter condições de ir para a Suécia para procurar o pai.

Aina o encontrou enfermo por causa de diabetes e derrame. Após a conversa inicial de reconhecimento, contou a ele sobre o que Deus fizera na África através do trabalho e sacrifício deles e como Deus transformou aquele menino em um grande pregador da Palavra. David chorou arrependido e a bondade de Deus o conduziu ao perdão e à restauração da comunhão com Ele.

O garoto africano que tinha sido conduzido a Cristo no topo daquela montanha conseguiu permissão do chefe da aldeia para abrir uma escola onde ensinou, também, o Evangelho de Cristo. Toda a aldeia foi alcançada e em seguida o Evangelho foi pregado nas vizinhanças e se expandiu atingindo todo o Congo.

Devido a esse trabalho direcionado pelo Espírito Santo, em poucos anos o país já contava com 32 postos missionários, um hospital e várias igrejas evangélicas com milhares de convertidos batizados.

Esta história ilustra que não podemos julgar nada à primeira vista, porque não sabemos o que Deus pretende fazer, através de nossos atos, a favor da expansão do Seu Reino. David passou mais de 45 anos sem saber que, através de apenas uma vida que se rendeu a Jesus, fruto de seu trabalho missionário, uma boa parte da população do Congo estava servindo ao Senhor.

O texto de 1Co 4.1-5 e os versículos seguintes demonstram que Paulo está defendendo o seu ministério dos críticos coríntios. Os vs. 1 e 2 deixam claro que este trecho está se referindo ao ministério dos apóstolos e seus auxiliares, porém a palavra ministro aqui teria uma tradução melhor se fosse “servo”, pois o original do grego é “hyperetai” (servos sob seu senhor)[2], ou escravos do Senhor. Neste caso, fazendo referência a servos e servas do Senhor os quais somos todos nós.

A palavra “despenseiro” ou “mordomo” significa o supervisor dos bens do seu senhor. Quando aplicados a nós, faz referência ao que Deus confiou a nós, os Seus mistérios. Os mistérios de Deus revelados a nós é a salvação em Jesus Cristo. O qual todos nós somos obrigados a divulgar para todas as pessoas à nossa volta. O fiel despenseiro é aquele que fala sobre a salvação em Jesus Cristo para aqueles que não a conhecem[3].

Por isto, analisaremos o ministério que está sob a responsabilidade de todos os crentes (não importando quão pequenos e humildes sejam). Isso porque o Senhor, para realizar a Sua Obra, usa quem Ele quiser, da maneira que quiser: “porque Deus é quem efetua em vós tanto o querer como o realizar, segundo a sua boa vontade.” (cf. Fp 2.13), e as realizações que fazemos após a nossa salvação são todas direcionadas pela soberania de Deus.

I. EU NÃO ME JULGO (v. 3)

3aTodavia, a mim mui pouco se me dá de ser julgado por vós ou por tribunal humano;”.


Paulo não está se colocando acima de qualquer avaliação ou crítica. Não é arrogância quando ele fala isso, mas sim resignação e humildade[4]. É submissão à vontade das pessoas ou das autoridades com relação ao seu ministério. É como se dissesse: “podem falar de mim o que quiserem e me avaliar como vocês quiserem, para mim está tudo bem.” Desde que [voltando para o vs 1] não se esqueçam quem nós somos e “nos considerem como ministros de Cristo e despenseiros dos mistérios de Deus”.

Não importa como vamos fazer a nossa parte! Se vamos apenas dar testemunho de comportamento cristão; ou falar da salvação em Cristo; ou entregar folhetos; ou orar pela salvação das pessoas; ou convidar alguém para vir à Igreja; ou ministrar na escola dominical; ou pregar a Palavra. O que pretendemos fazer é a vontade de Deus. Por isso fazemos o que está ao nosso alcance e não devemos nos preocupar se as pessoas acham que é pouco ou muito.

3bnem eu tampouco julgo a mim mesmo.” É como Paulo dissesse: “Eu da minha parte, não julgo nem o que eu fiz”.

Paulo já estava na terceira viagem missionária, já tinha escrito epístolas e já tinha pregado em muitos lugares. Mas não julgava se era bom ou não. Não julgava se era obra pequena ou grande. Ele não diminuía e nem valorizava seus feitos. Ele não julgava o alcance das suas obras no Reino de Deus.

Mas porque Paulo não conseguia avaliar-se? Porque o verdadeiro alcance espiritual dos nossos feitos, quem consegue ver e avaliar é somente Deus. Não adianta querer dizer, e acreditar, que estou fazendo uma grande obra para Deus, se Deus não pensa o mesmo. E não adianta pensar que as pequenas coisas que faço para Deus não tem valor nenhum. Da mesma forma o missionário David Flood não conseguiu ver que um simples garoto que vendia ovos, que foi evangelizado por eles, se tornaria um grande pregador em seu país na África. E Deus, através de seu ministério, transformaria todo aquele país.

Imagine você entregando um folheto simples para uma pessoa perdida no mundo das drogas e bebidas, do qual você sente compaixão. Você não sabe o seu nome e nunca mais verá essa pessoa. Essa pessoa se converte em outra igreja e depois se torna um pastor, um grande pregador e ganhador de almas. Você consegue imaginar o alcance de seu ato de entregar um simples folheto?

II O SENHOR ME JULGA (v. 4)

4 “Porque de nada me argúi [acusa] a consciência; contudo, nem por isso me dou por justificado, pois quem me julga é o Senhor.

É como se Paulo estivesse dizendo: Ainda que, para mim, esteja tudo certo, eu tenha feito tudo corretamente, e observado os mínimos detalhes. Ainda que eu tenha seguido um procedimento aprovado há muito tempo pela maioria das pessoas. E ainda que a minha consciência esteja tranquila com relação ao feito, e tenha recebido elogios quando finalizei a tarefa. Nem por isso vou dizer que cumpri a vontade do Senhor.

Isso porque eu [me colocando aqui] não sei se em algum momento do processo todo, eu tenha feito alguma coisa errada, ou que tenha faltado fazer alguma coisa, a partir de alguma variável inesperada ou variável oculta, que necessitava de uma decisão diferenciada.

Imagine que eu, saiba que um folheto evangelístico com o tema específico sobre o vício de bebidas precise ser colocado nas mãos de um alcoólatra. Eu dou o folheto para essa pessoa e depois viro as costas e vou embora, com a consciência tranquila porque eu fiz o meu trabalho da forma que sempre fiz. Mas assopra um vento forte e arranca o folheto das mãos do alcoólatra, que nem chegou a ver o que estava escrito no texto. E eu não vi que o alcoólatra estava sem o folheto, porque se tivesse visto, poderia voltar e dar outro folheto igual para ele.

A variável inesperada é o vento e a variável oculta para mim é o fato que eu não vi que o vento arrancou o folheto da mão do alcoólatra. Por isso, ainda que eu esteja de consciência tranquila acerca da minha obrigação, que para mim estava cumprida, nem por isso eu posso me justificar por ter feito a obra do Senhor corretamente, porque o Senhor sabe que não foi feito.

Em minhas convicções, em tudo o que acredito ser certo e verdadeiro, não há nada que me acuse a consciência, mas mesmo assim eu não posso me dar por justificado porque Deus mostrará para mim que, em algumas coisas, minhas convicções estão erradas.

O missionário David Flood estava irado com Deus. Ele achou que fizera tudo corretamente e tomou todas as atitudes certas com relação à obra missionária na África e depois com relação à sua volta para casa, abandonando tudo, inclusive a sua filha recém-nascida. No seu desespero, pelo aparente fracasso e pela morte da esposa, ele analisou todos os acontecidos conforme os seus critérios e chegou à conclusão que ele estava certo em tudo. Não quis saber se todo o acontecido estava conforme a vontade do Senhor.

Por isso, devemos adotar o mesmo procedimento que Paulo adotou com relação aos seus feitos: ainda que eu tenha feito tudo certo, ou ao contrário ainda que tenha saído alguma coisa errada nos procedimentos adotados, não vou me dar os parabéns e tampouco vou me criticar, porque o correto julgamento se deu certo ou errado, se cumpriu ou não a vontade do Senhor, somente o Senhor o sabe.

III NÃO JULGUEM ANTES DO TEMPO (v. 5)

5aPortanto, nada julgueis antes do tempo, até que venha o Senhor”,

A Igreja deve julgar os procedimentos que estão claramente errados. Quem claramente não obedece a Palavra de Deus deve passar pelo julgamento da Igreja de Cristo: “Ou não sabeis que os santos hão de julgar o mundo? Ora, se o mundo deverá ser julgado por vós, sois, acaso, indignos de julgar as coisas mínimas?” (1Co 6.2). O que Paulo está proibindo aqui é que se critique uma pessoa cujo comportamento esteja em harmonia com a Escritura. Quando Jesus voltar, e ninguém sabe quando será, cada crente participará do ato de julgar[5].

Vamos dar dois exemplos ilustrativos a respeito de julgar antes do tempo:

(1) Uma pessoa é criticada porque está entregando folhetos na rua. Alguém diz que essa pessoa tem um comportamento pecaminoso, portanto não é digno de entregar um folheto em nome da Igreja;

(2) Uma pessoa é criticada porque traz uma visita à Igreja. Alguém diz que essa pessoa tem um comportamento pecaminoso, portanto não é digno de trazer ninguém para visitar a Igreja.

Qual é a real intenção do entregador de folheto e do que traz a visita à Igreja? E qual é a intenção daquele que está criticando alguém que, mesmo que tenha falhas, está fazendo alguma coisa na Obra do Senhor?

5bo qual não somente trará à plena luz as coisas ocultas das trevas, mas também manifestará os desígnios dos corações

As palavras “coisas ocultas das trevas” podem ser traduzidas por “intenções ocultas” e essa parte do versículo quer dizer que O Senhor tornará públicas as coisas relativas ao homem, tanto as interiores como as exteriores. Dissipará as trevas e, assim, trará à luz todo tipo de coisas até então ocultas. No dia do julgamento, inúmeras coisas das quais os cristãos não tiveram conhecimento serão trazidas à luz.

Além disso, as pessoas são capazes de esconder pensamentos e intenções nos recantos íntimos do coração. Muitas dessas intenções nunca vêm à luz durante a vida terrena de uma pessoa. Mas, quando Jesus voltar, ele as tornará públicas, a fim de que todos os segredos sejam descobertos [e Paulo completa] “no dia em que Deus, por meio de Cristo Jesus, julgar os segredos dos homens, de conformidade com o meu evangelho.” (Rm 2.16)[6].

O missionário David Flood teve a oportunidade de saber, ainda em vida, tudo o que Deus fizera a partir daquele menino evangelizado por eles na África. Reconheceu que prejulgou de maneira errada o que Deus estava fazendo, e viu que de uma pequena coisa que ele fizera para Deus, e que considerou como nada e um trágico desperdício, Deus fez uma obra grandiosa naquele país da África.

5ce, então, cada um receberá o seu louvor da parte de Deus”.

Ap 22.12 explica que Deus distribuirá graciosamente o seu louvor a cada crente no dia do julgamento, quando Cristo haverá de revelar todas as coisas, conforme está no texto bíblico: “Eis que cedo venho e está comigo a minha recompensa, para retribuir a cada um segundo a sua obra.[7]”

CONCLUSÃO

Aprendemos que nós não temos capacidade de julgar nem os nossos atos e nem o que temos no coração e não sabemos se, o que fazemos para Jesus será pouco ou muito valorizado por Ele. E não temos capacidade de verificar o que está oculto no coração das pessoas e tampouco temos condições de julgar os atos delas, não importando a situação espiritual e nem como seus atos serão valorizados por Jesus.

Assim, não sabemos qual é o alcance espiritual dos atos que são feitos por nós e pelas outras pessoas. Somente no dia do Julgamento saberemos qual será o galardão que receberemos e qual galardão outras pessoa receberão; “e, então, cada um receberá o seu louvor da parte de Deus” (1Co 4.5c).


Bibliografia:

[1] DAVEY Stephen. David & Svea Flood. Disponível em: <https://www.wisdomonline.org/files/uploads/LegaciesofLightPart1-Flood.pdf> acesso em 02/12/2021.
[2] KISTEMAKER, Simon J. 1 Coríntios: Comentário do Novo Testamento. São Paulo: Cultura Cristã, 2003, p. 184.
[3] Idem p. 185-186
[4] Idem p. 187
[5] Idem p. 190
[6] Idem pp. 190-191
[7] Idem p. 191

Francisco Erdos
Francisco Erdos

Doutor em Teologia pela PUC-PR. Mestre em Teologia pela PUC-PR. Pós-graduado em Teologia Bíblica pela PUC-PR. Graduado em Teologia (integralização de créditos) pelo Centro de Ensino Superior de Maringá CESUMAR. Graduado em Teologia pelo Instituto e Seminário Bíblico de Londrina ISBL. Licenciado ao Ministério Pastoral pela Igreja Presbiteriana do Brasil. Casado com Ivanilza Erdos e têm dois filhos: Natan Henrique e Lucas Vinícius. Ver + Currículo

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